quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Audiência Pública destaca ênfase em ações articuladas para defesa das Religiões de Matriz Africana

A Audiência Pública das Religiões de Matriz Africana foi aberta pelo deputado Dirceu Dresch (PT), seguido pelo vereador Lino Peres (PT). A presidente da Associação dos Terreiros de Umbanda de Almas de Angola, Iara Silva, a primeira a fazer a fala, destacou a necessidade de respeito à legislação federal no que se refere ao direito de culto. Ela relatou que a Polícia Militar esteve em sua Casa para que os atabaques cessassem o som. Mãe Iara disse que não apenas sua casa foi atacada, mas, nesse gesto, todos os terreiros de matriz africana em Santa Catarina.
Em seguida, Apolônio Antonio da Silva, da Uniafro, disse esperar que se tenha outra visão sobre o tema da Audiência, a partir do apoio de parlamentares na Câmara de Vereadores e na Assembleia Legislativa, com respeito a seus valores. José Ribeiro, do Conselho das Populações Afro-Descendentes (CEPA), mencionou o Plano Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades de Matriz Africana, destacando que se espera, do poder público, mais do que ser ouvidos, e sim ações práticas: “É preciso repensar quem somos nós no processo histórico, recontando a história do país na nossa ótica”.
A representante do Movimento Negro Unificado (MNU), Maria Lurdes Mina (Lurdinha), ressaltou a importância da Audiência, mas lamentou a ausência de muitos pais e mães de santo negros, que sofrem ainda mais repressão e ficam na invisibilidade nas periferias. Mencionou o quanto eles são importantes em ações como as de saúde, porque os pais e mães de santos são os primeiros a ser procurados por quem sofre, nas periferias, de sofrimento físico e emocional. Esse momento de ataques aos terreiros, destacou, se insere num quadro maior de ataque orquestrado às manifestações da população negra, como no caso de políticas sociais como as cotas no ensino público superior. É preciso, então, união para que, de fato, as leis sejam respeitadas: “É importante o diálogo, mas é na luta que vamos vencer”.
Flávia Helena Lima, da Coordenadoria Municipal de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Prefeitura de Florianópolis (COPPIR), citou a importância do SOS Racismo, destacando a importância da defesa jurídica nesses casos. Sobre a ação dos órgãos ambientais, como a Floram e a Polícia Militar, disse que é necessário relatar as denúncias, no caso junto à Coordenação, para que sejam feitos os encaminhamentos necessários, porque a forma de atendimento às ocorrências às vezes é feita de forma inadequada em relação ao regulamento dos órgãos que atendem essas ocorrências.
O Sacerdote de Ifá, interlocutor da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa e conselheiro estratégico do Centro de Articulação de Populações Marginalizadas, Babalawo Ivanir dos Santos, destacou a necessidade de órgãos como a Polícia Militar, ao receberam denúncias sistemáticas, como no caso dos cultos nos terreiros, terem a iniciativa de investigar o que está acontecendo, para não serem o braço punitivo de um estado que é laico. Ele se referiu, nesse sentido, a uma parte dos evangélicos, que, por via de sua bancada parlamentar, atuam de forma explícita contra as religiões de matriz africana. Destacou que, no que se refere à repressão, ela não acontece em sinagogas dos judeus ou em igrejas católicas. Além disso, num estado laico, há casos de professores, juízes, que, em seu trabalho, atuam com base em sua orientação religiosa, e não levam em conta justamente o fato de o estado ser laico.
Ivanir dos Santos sugeriu vários encaminhamentos, como fazer dossiês dos casos de repressão e divulgá-los em nível nacional e internacional; criar Frente Parlamentar Municipal e Estadual Contra a Intolerância Religiosa; buscar apoio em órgãos como o Conselho Nacional de Justiça para dar a resposta à ação do Ministério Público nos inquéritos relacionados aos terreiros; estimular campanha pelo artigo 20 da CF, de discriminação religiosa; multiplicar o guia de combate contra a intolerância religiosa; publicizar o projeto de lideranças evangélicas contra as religiões de matriz africana; fazer caminhada estadual para dar visibilidade ao assunto, unindo-se à lideranças de outras matrizes religiosas. Ivanir dos Santos destacou que o estado laico tem que proteger os mais fracos, e que a PM em Santa Catarina deve estudar as denúncias para ter uma maior compreensão do fato político no qual se insere a discriminação contra as religiões de matriz africana.  Lembrou que as Casas são espaços de culto e, diferenciadas ou não, não podem ser invadidas, e é preciso ter clareza disso para se fazer o debate. Acentuou que a discriminação racial necessariamente não une, mas a intolerância religiosa une, mobiliza, e há que se pensar nesse elemento para fazer a luta. 
O coronel João Schorne de Amorim, do comando da Polícia Militar de Santa Catarina, mencionou que a Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP) solicitou informações sobre o que estava sendo feito para melhorar a vida dos policiais militares afro-descendentes, o que causou surpresa porque não há, na PM, esse entendimento diferenciado entre raças, tanto no âmbito externo quanto interno. Por isso também não foi possível atender o mandato do vereador Lino Peres quando foi solicitado à PM o número de abordagens específicas a cultos religiosos, porque não é feita essa separação, os casos são assinalados como perturbação do sossego alheio, baseados em atendimento à solicitação de alguém da comunidade. Destacou que será debatida a mudança de procedimento de atendimento nos casos que têm relação com as Casas, com o envolvimento de vários órgãos e entidades, mapeando, de forma geoprocessada, os locais de culto e seu entorno para dar respostas aos conflitos. 


O mandato do vereador Lino Peres em breve irá disponibilizar a Ata da Audiência Pública sobre as Religiões de Matriz Africana. 

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