Projeto de Lei Complementar n.º
01292/2013
Autor: Prefeito Municipal – Cesar Souza Junior
Ementa: Institui o plano diretor de urbanismo do município de
Florianópolis que dispõe sobre a política de desenvolvimento urbano, o plano de
uso e ocupação, os instrumentos urbanísticos e o sistema de gestão.
Procedência: Comissão de Viação, Obras Públicas e Urbanismo
VOTO EM SEPARADO
Trata o presente de proferir voto
em separado ao Projeto de Lei Complementar n.º 01292/2013, da lavra do Prefeito
Municipal Cesar Souza Junior, que institui o plano diretor de urbanismo do
município de Florianópolis que dispõe sobre a política de desenvolvimento
urbano, o plano de uso e ocupação, os instrumentos urbanísticos e o sistema de
gestão.
Consta no Regimento Interno desta
Casa:
Art. 39. É competência específica:
....................................................................................................................................
III - da Comissão de Viação, Obras Públicas e
Urbanismo, exarar parecer sobre todos os processos atinentes à realização de
obras e à execução de serviços pelo Município, pelas autarquias, pelas
entidades paraestatais e convencionais de serviços públicos de âmbito municipal
e próprios relativos aos planos gerais ou parciais de urbanização, ao cadastro
territorial do Município e ao transporte coletivo; ....................................................................................................................................
Sendo assim, na qualidade de
membro desta Comissão de Viação, Obras Públicas e Urbanismo, além de tecer
considerações sobre o processo que levou à elaboração do presente PLC, pretendo
me ater, também, no presente voto em separado, às questões relativas aos
conteúdos da proposição que digam respeito ao planejamento físico-territorial
local.
I
– Considerações iniciais sobre o processo que levou à elaboração da presente
proposição
No ano de 2006, o Poder Executivo
Municipal de Florianópolis deu início a um processo que poderia inaugurar uma
nova realidade no contexto do planejamento e gestão do desenvolvimento
territorial e urbanístico local.
Na época, representantes dos
Poderes Executivo e Legislativo Municipais, setores organizados da sociedade e
cidadãos deram início ao processo participativo de revisão do Plano Diretor de
Florianópolis, devidamente apoiado pelo marco jurídico estabelecido pela Lei
Federal n.°10.257, de 10 de julho de 2001 – denominado oficialmente Estatuto da
Cidade, norma que regulamenta o capítulo da política urbana da Constituição da
República Federativa do Brasil –, bem como pelas orientações das Resoluções do
Conselho das Cidades, especialmente as de n.° 13, 25 e 34.
Ao longo de todo o ano de 2006, e
até 2008, reunião após reunião, a comunidade teve a oportunidade de se envolver
num processo voltado à percepção das complexidades do município, dos seus
problemas e das suas potencialidades, com o objetivo de – orientado pela
diretriz inserta nos termos do art. 2.°, II, do Estatuto da Cidade (“gestão
democrática por meio da participação da população e de associações
representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e
acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano”) –,
estabelecer pactos para buscar resolver esses problemas e melhor aproveitar
suas potencialidades, e, a partir daí, fornecer insumos para elaboração pelo
Poder Executivo Municipal do novo plano diretor.
A falácia que a atual
administração apregoou de que era urgente a entrega do PLC do plano diretor à
Câmara Municipal é de que a sociedade já o havia discutido suficientemente, o
que não é verdade. O que de fato ocorreu, e que não é noticiado na mídia, é que
a população através de suas organizações de bairro e distrito discutiu o plano
diretor durante 2007 e 2008, mesmo assim com muitas deficiências continuamente
denunciadas, como falta de apoio técnico suficiente, falta de recursos próprios
para promover um amplo debate sobre este tema, carência de um plano de mídia. O
máximo que foi feito foi uma Cartilha sobre o plano diretor. Depois, em final
de 2008, o prefeito anterior interrompeu o processo, de discussões do PD e
suspendeu o então Núcleo Gestor Municipal do plano diretor. Licitou uma pessoa
jurídica argentina, denominada fundação CEPA, para elaborar “tecnicamente” o
plano diretor e, em março de 2010, no TAC, sob protestos da população
organizada, não conseguiu nem apresentar o PLC, sendo que mais tarde se tentou
novamente apresentar o projeto na ALESC, que foi novamente rejeitado. Somente o
retomou em novembro de 2011, e devido a recurso judicial no Ministério Público.
Durante o primeiro semestre de 2012, discutiu-se de forma precária e sem ampla
participação a parte metodológica do PD, mas devido às eleições, as discussões
foram praticamente paralisadas.
Chegamos à atual gestão da
Prefeitura. No início deste ano, várias lideranças pediram audiência com o
prefeito, mas este não os recebeu e, durante o primeiro semestre, optou por
ficar reestruturando a equipe que trabalharia no plano diretor e a base de
dados, segundo o que alegava. Apresentou, em evento realizado no auditório da
UFSC, linhas gerais de como conduziria as discussões no final do primeiro
semestre. No entanto, apesar de poucas reuniões convocadas do NGMPDP, a
prefeitura, às pressas, promoveu 41 reuniões mal divulgadas e mal instruídas
tecnicamente durante o mês de setembro e, em 18/10, para surpresa da maioria da
população organizada e de setores profissionais, acadêmicos e empresariais, o
Executivo submeteu o PLC à tramitação legislativa, com um cronograma acelerado
e sem amadurecimento das discussões do PD, não considerando o que estabelece a
legislação que garante a ampla participação da população.
As 41 reuniões que a Prefeitura de
Florianópolis realizou, a partir de final de setembro até a entrega do Projeto
de Lei à Câmara Municipal, não configuram um real processo participativo, pois
foram reuniões apenas consultivas, mesmo com o título de “oficinas”. Nos anos
de 2007 e 2008, de fato houve uma série de reuniões da equipe técnica da PMF
com as comunidades, ainda que vários problemas de organização e divulgação das
reuniões e com baixo apoio financeiro, que configuraram as leituras
técnico-comunitárias que culminaram com as Audiências Públicas Distritais, de
caráter deliberativo, como apregoa o estatuto da Cidade e a Resolução 25 do
Concidades. Desta vez, as reuniões
promovidas pela PMF foram mal divulgadas e com baixa participação em diversos
momentos, além do fato de que as pessoas que foram chamadas não corresponderam
às bases comunitárias do Núcleo Gestor Municipal do PDP. As insistentes
reclamações dos representantes distritais no âmbito do núcleo gestor e das
reuniões da prefeitura assinalam que as diretrizes aprovadas em audiência
pública distrital, ainda em 2008, não foram consideradas, apesar das alegações
do secretário da SMDU de que foram incorporadas no Projeto de Lei entregue à
CMF.
Na reunião realizada no CDL, que
contou com a presença do Secretário da SMDU, do Arquiteto Colombiano convidado,
Gustavo Restrepo, de entidades empresariais, como SINDUSCON, da ONG
Floripamanhã, de membros diretoria do CAU/SC (Conselho de Arquitetura e
Urbanismo de SC), de representação da OAB/SC e de profissionais de diversas
áreas, fizeram-se as mesmas reclamações, no sentido da insuficiência técnica de
dados e informações fidedignas, inconsistência metodológica e falta de tempo
adequado para o devido amadurecimento técnico da matéria.
Na Audiência Pública, promovida
pela prefeitura, realizada em outubro passado no Auditório Antonieta de Barros,
ficou evidente, diante da grande maioria das falas de pessoas inscritas para se
pronunciar, que o processo de discussão do PL da PMF não foi suficientemente
discutido e avaliado. A própria audiência pública configurou as distorções no
processo participativo, uma vez que aludido evento consistiu em mero espaço de
pronunciamento das pessoas inscritas e de resposta da prefeitura, na pessoa do
Secretário da SMDU, sem o uso de material como mapas para situar os presentes
na audiência e sem buscar pactuações e deliberações em prol do aperfeiçoamento
da matéria.
No âmbito do Legislativo
municipal, infelizmente, se repetiu a mesma lógica. No início da presente
legislatura, este vereador tentou, sem sucesso, aprovar um requerimento de
criação da Frente Parlamentar do Plano Diretor Participativo. O objetivo era
atender às necessidades
de se promover atividades voltadas ao preparo da Câmara Municipal para aludida
tramitação, por meio do acompanhamento das ações da prefeitura, bem como da
Sociedade no que toca à revisão do atual plano diretor, e, ainda, criar um
espaço para debate, com o consequente levantamento de propostas que visassem
mudanças regimentais que auxiliassem os vereadores a desempenhar adequadamente
as suas atribuições legislativas, voltadas à aprovação do instrumento básico da
política urbana local.
O vereador Ricardo Camargo Vieira tentou, também
em vão, aprovar regras especiais para tramitação do plano diretor, a partir de
documento subscrito por este vereador e pelo vereador Afrânio Boppré.
A audiência pública realizada, embora
tenha reunido no seu início centenas de pessoas, foi um evento típico do que
planejadores urbanos sérios costumam chamar de planejamento de auditório. Ritos
formais para burlar garantias constitucionais de participação e controle social
e, como sempre, a velha falta de método que transforma o instrumento audiência
pública num evento sub-aproveitado. O evento aconteceu com base em um regimento
interno que não dá suporte a uma tramitação racional, equilibrada e adequada à
complexidade da matéria. Venceu o discurso da pressa em prejuízo do Princípio
da Precaução. Prevaleceu a lógica da submissão do Parlamento ao Executivo, a
ponto das sugestões de emendas a um PLC que já estava tramitando no Legislativo
serem entregues na mão do Secretário da SMDU, que compunha a Mesa.
Nesse momento, a forma açodada de
se tramitar o plano continua prevalecendo. Aludida tramitação ocorre de forma
simultânea no âmbito das Comissões de mérito. Reuniões para sistematização de
emendas feitas na pressa, a ponto de, em menos de duas semanas, o PLC contar
com menos que mais seiscentas emendas. Como é possível se dar uma tramitação
que resulta em tantas emendas sem uma análise técnica das mesmas? Se é que
essas análises foram feitas, quem as realizou?
Qual o Urbanista que assina o Registro de Responsabilidade Técnica,
exigido pelo respectivo conselho profissional, sobre essas emendas? Como a
população pode se inteirar dessas emendas em tão curto espaço de tempo? Como se
dá a publicidade delas? Como que se garante a coerência lógica e a correta
sistematização dos conteúdos pretendidos pelo PLC original? Diante de tantas
emendas, o que será apresentado afinal? Um substitutivo global? Como que tantas
alterações são recepcionadas pelo órgão de planejamento urbano da prefeitura, a
saber, o IPUF? Não teria que se manifestar nos autos? Como que se comunicam as
deliberações comissões de mérito em tão curto espaço de tempo? Qual a
razoabilidade que existe num plano diretor feito ao longo de anos ser alterado
em dias pela Câmara Municipal? E, finalmente, como se dá o processo
participativo no âmbito da Câmara para se discutir e decidir, junto com a
população, os rumos tantas alterações propostas?
II
– Considerações sobre o conteúdo do presente PLC
II.1- Reconhecimento de alguns
avanços
Antes de tudo, deixamos claro aqui
que apesar das observações referentes a ausências de informações e deficiência
ou insuficiência de especificação técnica e jurídica de dispositivos do Projeto
de Lei da Prefeitura, reconhecemos que o PL avançou em alguns aspectos que
devem ser reconhecidos, como:
a) adoção de restrição de
gabaritos a dois pavimentos em várias regiões, distritos e bairros,
aproximando-se do que as comunidades vêm há muito tempo pleiteando;
b) fazer com que os condomínios e
loteamentos reservem áreas obrigatórias na legislação, como o que estabelece a Lei
Federal n.º 6766/1979, frontais de acesso público, além dos moradores destes
empreendimentos;
c) ter preocupação, ainda que não
viabilizado concretamente por falta de especificação mais clara, com a
preservação ambiental;
d) à semelhança do PL da CEPA,
elaborado na administração anterior,
desenvolver um capítulo para a preservação cultural, através das APC, com a
finalidade de proteção do patrimônio cultural material e imaterial, aspecto
este novo na legislação, como os locais de memória e área de interesse cidadão, e outro para ás áreas de interesse
ambiental paisagístico, desenvolvendo-se diversos instrumentos de garantia da
paisagem, através de elementos
excepcionais componentes das paisagens como de marcos referenciais,
mirantes e belvederes, arte pública, aspectos que estruturam o PL, ora em
tramitação nesta Casa, chamado de “Cidade Limpa”;
e) estabelecimento de índice de
aproveitamento 1,0, embora com imprecisões de sua aplicação e falta de
estratégias de implementação.
Passemos agora a uma avaliação
critica que conduzirá aos óbices e questionamentos, surgidos a partir da
presente análise de mérito.
II.2 - Sobre a inconsistência
técnica do presente PLC
Da análise do presente PLC, pode-se
verificar claramente e conforme já expusemos antes, ausência, insuficiência ou
deficiência de uma base de dados e informações estatísticas e cartográficas que
embasem o PL, assim como imprecisões conceituais e técnico-científicas, tais
como:
a) Falta de informações
fidedignas: ausência de mapas imprescindíveis para o planejamento do uso e
ocupação solo.
b) Modelo de cidade implícito ou
explícito no Projeto de Lei da PMF: confusão entre plano e projeto.
c) Falta de uma melhor abordagem
da questão metropolitana.
d)
Imprecisão e falta de clareza do conceito de centralidade e núcleos e
outras denominações no que concerne ao termo multicentralidade e
poli-nucleação.
e) Existência de conceito de
enclave, porém sem localização em mapa (ver parágrafo 2º. do art. 177 e inciso XXVIII
do art. 259).
f) A conversão de elementos
estruturantes do Plano Diretor, que ficaram como “Projetos Específicos” para
serem elaborados posteriormente e que deveriam ser previstos no corpo do PLC:
f.1) Plano
e mapa de condicionantes ambientais, incluindo mapa de geotecnia (com previsão
de áreas de risco), mapa vegetação (primária, secundária e terciária), mapa
isodeclividades (verificação de áreas de drenagem e sujeitas a alagamentos);
f.2) Plano
e mapa de mobilidade urbana que estrutura o sistema de acesso ao trabalho e
serviços urbanos em geral. Portanto, deve-se definir sua natureza, tipologia,
localização, origem e destino, relação com o sistema viário e capacidade de
suporte, inter e multimodalidade, etc
f.3) Plano
e mapa de macro-drenagem que define o grau de ocupabilidade de uma região ou
setor urbano;
f.4) Plano
e mapa de uso do solo em serviços urbanos e emprego;
f.5) Mapa
de mascaramento solar (volumetrias propostas e projeção solar em todas as
estações).
g) Gabaritos estabelecidos sem
critério claro: a restrição do gabarito em determinadas regiões e sua liberação
em outras junto com as OUC, conforme analisamos anteriormente com:
g.1)
Reprodução de tipologias do atual PD 01/1997, principalmente na parte central;
g.2)
Tipologias estabelecidas sem estudo de projeção solar e de aplicação das
próprias diretrizes referentes à Paisagem Urbana que o PL nas suas Seções de
Seção III assinala;
g.3)
Reprodução das tipologias dos edifícios residenciais sem atividades de comércio
e serviços no térreo que podem matar partes da cidade como a previsão de
verticalização residencial no centro histórico;
g.4)
Ausência da figura do “amembramento” ou “remembramento” nos incisos do art. 65.
É necessário que se induza à criação de espaços “vazios” para visualidade ente
edifícios, quando o proprietário verticalizar a partir de certa altura.
7) Os Pólos Geradores de Tráfego
(PGT), sua desvinculação com o Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV) e não
define a abrangência da vizinhança; qual seria o critério do porte do
empreendimento a partir de 2000 m2?. Deve estar vinculado ao EIV
(Capítulo X).
II.3 – Sobre as leituras
técnico-comunitárias
As leituras técnico-comunitárias,
para elaboração do zoneamento, como determina o estatuto da Cidade e orientação
do Ministério das Cidades, em seu Manual sobre elaboração de planos diretores,
deveria resultar:
ü
na descrição das características atuais de cada zona e área de
especial interesse;
ü
na descrição das condicionantes que limitariam ou
inviabilizariam a ocupação de cada zona e área de especial interesse;
ü
na explicitação dos objetivos pretendidos pela comunidade para o
futuro de cada zona e área de especial interesse;
ü
em diretrizes e estratégias de ocupação a curto, médio e longo
prazos (construção de cenários);
ü
na espacialização dos instrumentos de natureza social,
urbanístico-jurídico e tributário e financeiro do Estatuto da Cidade mais
adequados, considerada a realidade e o interesse locais, para que se pudesse
fazer com que cada zona e área de especial interesse, e, por conseguinte, cada
propriedade nelas existentes, cumprisse com sua função social, alcançando os
objetivos pactuados nas oficinas. No entanto, com relação ao item “1”:
Não se apresentaram mapas de
diagnóstico sobre projeção populacional para 10, 20 e 30 anos; mapas de uso do
solo em suas diversas modalidades, como qualquer trabalho acadêmico o faz como
condição para lançamento de propostas espaciais.
Some-se a isto, não se especificou
o histórico de ocupação de da zona ou área de especial interesse,
identificando-se a natureza de uso e “vocação” da área em estudo, indicando-se
transformações sociais decorrentes.
Não se descreveram as
características históricas, atuais e tendenciais de cada zona de e área de
especial interesse, tanto nas AUE (Áreas urbanísticas Especiais) como nas OUC;
Não há mapas de condicionantes
ambientais que limitariam ou inviabilizariam a ocupação de cada zona e área de
especial interesse, como tanto se pleiteou na gestão municipal anterior. Depois
de oito meses de demanda, conseguiram mapas de condicionantes ambientais,
através de processo licitatório e com o
erário público e, no entanto, estes mapas não foram utilizados nas reuniões e
oficinas, tão pouco se esclareceu onde estão. A atual administração municipal
deve uma explicação pública sobre onde foram para os mapas mencionados e das
razões de não serem retomados ou consultados
Com relação aos objetivos,
diretrizes e estratégias para a elaboração do PL ficaram sem o devido
aprofundamento e ficou a desconfiança pelas lideranças comunitárias se, de fato,
foram incorporados no PL, devido à falta de uma efetiva troca de experiências
entre as comunidades e o corpo técnico da SMDU e IPUF.
Pelo que se assinalou antes a
respeito dos instrumentos, ficou claro que não houve a devida espacialização
dos instrumentos de natureza social, urbanístico-jurídico e tributário e
financeiro do Estatuto da Cidade mais adequados, considerada a realidade e o
interesse locais e áreas de especial interesse.
III.4 - Vinculação a diretrizes
Gerais da Política Urbana
A Constituição Federal determina
que a política urbana é executada pelo poder público municipal conforme
diretrizes gerais fixadas em lei. Tais diretrizes gerais são as previstas nos
termos do art. 2.°, I a XVII/Estatuto da Cidade, e, sendo assim devem ser os
balizadores da elaboração deste que é o instrumento básico da política urbana
local. Significa dizer que as diretrizes do Estatuto da Cidade têm força
vinculante com relação aos Poderes Executivo e Legislativo municipais. Em
outras palavras, não pode a prefeitura propor um novo plano diretor, nem a
Câmara de Vereadores aprová-lo, sem o devido respeito às aludidas diretrizes.
Dentre as diretrizes supracitadas,
chamamos a atenção para as seguintes, posto que dentro do raio de atuação da
presente Comissão de Viação, Obras Públicas e Urbanismo:
IV – planejamento do desenvolvimento das
cidades, da distribuição espacial da população e das atividades econômicas do
Município e do território sob sua área de influência, de modo a evitar e
corrigir as distorções do crescimento urbano e seus efeitos negativos sobre o
meio ambiente;
V – oferta de equipamentos urbanos e
comunitários, transporte e serviços públicos adequados aos interesses e
necessidades da população e às características locais;
VI – ordenação e controle do uso do solo, de
forma a evitar:
a) a utilização inadequada dos imóveis
urbanos;
b) a proximidade de usos incompatíveis ou
inconvenientes;
c) o parcelamento do solo, a edificação ou o
uso excessivos ou inadequados em relação à infra-estrutura urbana;
d) a instalação de empreendimentos ou
atividades que possam funcionar como pólos geradores de tráfego, sem a previsão
da infra-estrutura correspondente;
e) a retenção especulativa de imóvel urbano,
que resulte na sua subutilização ou não utilização;
f) a deterioração das áreas urbanizadas;
g) a poluição e a degradação ambiental;
h) a exposição da população a riscos de
desastres.
................................................................................................................
IX – justa distribuição dos benefícios e ônus
decorrentes do processo de urbanização;
.................................................................................................................
XI – recuperação dos investimentos do Poder
Público de que tenha resultado a valorização de imóveis urbanos;
XII – proteção, preservação e recuperação do
meio ambiente natural e construído, do patrimônio cultural, histórico,
artístico, paisagístico e arqueológico;
.................................................................................................................
XIV – regularização fundiária e urbanização de
áreas ocupadas por população de baixa renda mediante o estabelecimento de
normas especiais de urbanização, uso e ocupação do solo e edificação,
consideradas a situação socioeconômica da população e as normas ambientais;
Para uma a boa instrução do
presente PLC, sobretudo para a sua segurança jurídica, seria importante que o
órgão municipal de planejamento se manifestasse, no sentido de demonstrar em
que medida a presente proposição está devidamente alinhada com as aludidas
diretrizes.
III.4 – Sobre os instrumentos
urbanísticos
O art. 1.°, IV, da Resolução 34/CONCIDADES
diz que o Plano Diretor deve prever os instrumentos da política urbana
previstos pelo art. 42 do Estatuto da Cidade, vinculando-os aos objetivos e
estratégias estabelecidos no Plano Diretor. Ou seja, os instrumentos servem
para cumprir os objetivos que o plano diretor pretende alcançar. Da leitura
integral do Projeto de Lei ora apresentado, não se pode constatar se os
instrumentos urbanísticos foram regulamentados com a coerência necessária que
deve haver na relação instrumento aplicado/objetivo a alcançar. Caberia
consulta ao IPUF, a fim de que este demonstre a relação entre instrumentos e
objetivos.
Conforme análise deste vereador,
como pesquisador em planejamento urbano e plano diretor, e nas análises feitas
pela OAB-SC, por técnicos por parte do CREA-SC e pela arq. Sílvia Lenzi, como
representante do CAU-SC, cuja análise foi apresentada no encontro no CDL,
citado acima, o Título III Instrumentos Urbanísticos está mal instruído,
havendo um desequilíbrio de tratamento, da seguinte forma:
a) Na regulação do EIV (Estudos de
Impacto de Vizinhança) nos arts. 251 a 269, ainda há imprecisões decisivas,
como:
ü
não define quem paga o EIV e a garantia de autonomia da equipe
encarregada pelo EIV do empreendedor;
ü
a OAB-SC em seu documento assinala que é preciso “encontrar um
equilíbrio entre segurança jurídica e juízo de discricionalidade” no parágrafo
único art. 259;
ü
ainda a OAB-SC assinala que se deve “... regulamentar o
procedimento de análise, rejeição e aprovação do EIV e do estudo específico de
localização em prazo máximo de noventa
dias após a publicação da presente Lei Complementar”;
ü
deve-se salientar que estudos científicos e acadêmicos sobre o
EIV ainda estão em maturação, entendendo que o conceito de vizinhança ainda
está em construção. Por isso que é recomendável que se faça uma avaliação,
depois de implementado este instrumento, junto a técnicos, entidades
profissionais, academia e órgãos de planejamento da PMF para verificar o grau
de eficácia deste instrumento.
b) Os instrumentos Direito de
Superfície (art. 243) e o Direito de Preempção (art. 244) estão genéricos e não
vinculados a nenhum mapa específico. Desta forma, ficam inócuos para a sua
efetiva aplicação e se perde uma oportunidade ímpar de utilização como meio
para garantir a função social da propriedade e da cidade e fazer cumprir o
papel reitor do órgão público municipal de destinar terras para com efeitos
sociais, ambientais e públicos. O Direto de Preempção está incompleto mesmo do
ponto de vista do que estabelece o estatuto da Cidade.
c) As Operações Urbanas Consorciadas
(arts. 247 a 249) estão desvinculadas dos mapas, nos quais aparecem, mas sem
especificação. São áreas vazias nos mapas, especificadas com cores, o que
contradiz o instrumento estabelecido no Estatuto da Cidade. Com relação às
operações urbanas consorciadas (OUC), leia-se o parágrafo primeiro do art. 32
do Estatuto da Cidade:
§1.º - Considera-se operação urbana
consorciada o conjunto de intervenções e medidas coordenadas pelo Poder Público
municipal, com a participação dos proprietários, moradores, usuários
permanentes e investidores privados, com o objetivo de alcançar em uma área
transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e a valorização
ambiental.
Cite-se a conceituação adotada
para a as chamadas “OUC” no art. 113 do presente PLC:
Art. 113. As Operações Urbanas Consorciadas
(OUC) de realização prioritária são um conjunto de intervenções e medidas
coordenadas ou autorizadas pelo poder público municipal, com início obrigatório
num prazo de até dois anos após a aprovação desta Lei Complementar.
Ressalte-se agora que as chamadas
“OUC” estão espacializadas, no mapeamento constante neste PLC, sobre áreas
desprovidas de qualquer construção.
Causa estranheza a forma como se
pretende aplicar o instrumento nesta cidade. Conceitualmente, as operações
urbanas consorciadas visam promover melhorias sobre o meio ambiente construído.
É instrumento por excelência para promover, por exemplo, a revitalização de
áreas degradadas das cidades, como os centros urbanos. Seria pertinente, no
nosso caso para promover as intervenções em espaços, como o aterro da Baía Sul.
Onde estão especificadas as
transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e valorização
ambiental no corpo do PL ou nos mapas? Como estabelecer a participação de
proprietários, moradores, usuários permanentes e investidores privados? Nada
está especificado, o que fragiliza este instrumento e permite processo
especulativo nos terrenos assinalados nos mapas sem amarração com os objetivos
maiores deste instrumento. Deve-se evitar o que ocorreu na Rua Faria Lima em
São Paulo, cuja aplicação deste instrumento desvirtuou sua função social. Em
face ao exposto, deve-se suspender este instrumento do PL para melhor discussão
com a sociedade ou que a PMF indique outras áreas para a aplicação deste
instrumento, como o fez no terreno da Cassol na Vila Aparecida, no qual se pode
estabelecer parceria desta empresa com os moradores de baixa renda do
local.
O uso inadequado deste instrumento
e tendência de utilização privada do instrumento, porque as OUC prescritas no
zoneamento estão vinculadas a grandes proprietários de terra e sem amarração à
sua utilização social e com ações compensatórias. Está sendo utilizado o meio ambiente natural,
como as áreas da Habitasul, Ratones, Santo Antonio de Lisboa e os Aterros da
Baia Sul e outras. Deve ser aplicado em ambiente construído com finalidade de
promover transformações urbanísticas estruturais na área social, urbanística de
alto interesse público, patrimônio material e imaterial (ambiências históricas
e culturais).
Os denominados CEPAC (Certificados
Adicionais de Construção) descritos no art. 250 estão desamarrados de sua
aplicação da OUC e dos mapas.
d) Os dispositivos que tratam do Parcelamento,
Edificação ou Utilização Compulsórios não têm áreas definidas de vazios urbanos
nos mapas, ficando solto de uma efetiva aplicação. Devem-se definir estas áreas
para que cumpram a função social da propriedade e se evitem o caráter
especulativo da retenção de terrenos. Fixa-se um prazo de 360 dias para viger
uma lei específica que identificará os imóveis passíveis de aplicação deste
instrumento e as condições para que o proprietário cumpra esta obrigação.
Mesmo que aqui se admitisse que
foi feita uma correta definição dos critérios para a caracterização de imóveis
não edificados, subutilizados e não utilizados, não foram mapeadas as áreas de
incidência do instrumento e definidos prazos para identificação dos imóveis não
edificados, subutilizados e não utilizados, bem como para notificação dos
proprietários, para que procedam com as devidas providências. Sendo assim, não
se verificou preocupação de seguir o disposto nos termos do art. 3.° I, III e
IV, da Resolução 34 do Conselho das Cidades.
e) Com relação às ZEIS e AEIS e à
Regularização Fundiária, chama a atenção primeiramente que o PLC não menciona o
Plano Municipal de Habitação de Interesse Social, aprovado no Conselho da
Habitação. Considerando que grande parte dos planos específicos será entregue
posteriormente, nesse caso, não está nem mencionado, assim como o Plano
Municipal de Saneamento Básico. Que já foi aprovado pela CMF.
Em segundo lugar, não consta o
zoneamento anexo das ZEIS, referido no art. 198.
Em terceiro lugar, não há criação
de Banco de Terras, que é um instrumento central para o financiamento de
programas habitacionais e de regularização fundiária e urbana.
Este tópico denota bem a falta de
organização técnica do PLC. Justamente este dispositivo que está mais bem
estudado pela Secretaria da Habitação da PMF é desconsiderado, como se não houvesse
este acúmulo.
f) Quanto ao instrumento Outorga
Onerosa do Direito de Construir, ainda que tenha se adotado índice 1,0, este
coeficiente não está amarrado por zona ou macro-zona. Por exemplo, o índice 1,0
no Campeche, em que o PL adotou, e atendendo as comunidades do local, altura de
dois pavimentos, equivale a índice máximo, o que o torna ineficaz. Ainda que o PL tenha adotado o gabarito
restritivo, e, corretamente, em várias regiões para se evitar a recarga
populacional e edilícia no meio ambiente e principalmente nos lençóis freáticos
de Ingleses, Rio Vermelho e Campeche e em face da vulnerabilidade da região da
Lagoa da Conceição e Rio vermelho, Ratones e Santo Antonio de Lisboa, foi liberado
o gabarito em outras regiões como principalmente a parte continental do
município com alturas entre 8 e 16 pavimentos, sem especificação de índices
máximos e mínimos, no caso, para se identificar os vazios urbanos. Portanto,
este instrumento ficou sem o devido detalhamento e especificação de como será
aplicado por região ou zona. Este
instrumento é fundamental para que se evite a sobre-saturação do uso do solo e
para que se taxe com utilização de alturas acima do índice básico, no caso o
coeficiente 1,0. Este instrumento serve não somente como mecanismo de sobretaxação,
mas principalmente para se prevenir contra a utilização edificatória acima da
capacidade de suporte de uma determinada região ou zona urbana. Para isso, não
há um diagnóstico e mapas correspondentes sobre a capacidade suporte por região
ou zona urbana por parte da CASAN, CELESC e COMCAP a respeito da infraestrutura
de saneamento, capacidade de rede de energia e nível dos serviços de coleta de
lixo e tão pouco diagnóstico sobre a rede viária e sua capacidade de absorção
de tráfego para as condições atuais e futuras.
Faltam, portanto, mapas da situação das atuais redes citadas e sua
projeção de capacidade de absorção de aumento populacional e de edificações que
o PL estabelece. Não há também um mapa de área públicas de lazer e verde para
as necessidade atuais e para o aumento populacional que se prevê com o aumento
dos gabaritos. Um exemplo ilustrativo e típico é a relação de área verde por
habitante na parte continental do município que há anos atrás estava em 0,5 m2
por habitante. Como de lá para cá não se ampliaram as áreas públicas nesta
região e a população aumentou, presume-se, com clareza, que atualmente este
índice se reduziu, Com o aumento de gabaritos para até 12 e até 16 pavimentos,
como ao longo da BR 282, este índice cairá ainda mais. A construção parcial da
Beira Mar Norte Continental atenua um pouco este índice. Mas, como está
parcialmente equipada, este problema persiste.
g) A respeito do instrumento Transferência
do Direito de Construir, não está previsto nem em que áreas será aplicado
(construções e conjuntos históricos, etc) e tampouco as áreas para onde índices
serão aplicados de aproveitamento 1,0. Não especifica este instrumento no PLC
que o preço a desapropriar deve ser o de mercado e não deixa claro que o
direito de construir é uma faculdade que pode ser concedida ao proprietário se
ele aceitar, não podendo ser impositiva (OAB-SC). Atualmente, o município
dispõe no âmbito da sua Procuradoria Geral de 70.000,00 m2 de
estoque de áreas, resultado da aplicação deste instrumento. Pelo que está
estabelecido no art. 246, não se assegura o controlar deste excedente
construtivo e sob que forma destiná-lo dentro de um programa urbanístico.
Novamente, aqui neste instrumento não se prevê quais as áreas em que será
aplicado e para onde migrarão os índices das edificações de origem. Em
Florianópolis, temos experiências negativas de transferência de índice para
regiões ou zonas, como no bairro João Paulo, por exemplo, em que os índices
transferidos acabaram por saturar a capacidade de suporte da região,
ocasionando problemas na infraestrutura. Falta, portanto, mapas de incidência
deste instrumento. O PL não especifica, tampouco, qual o prazo para gerar estes
mapas.
Como se pode verificar
anteriormente, no que diz respeito à regulamentação de vários instrumentos do
Estatuto da Cidade no município, esta deveria ser feita de forma a cumprir com
o disposto no art. 42, I e II, desta mesma Lei Federal, e seguindo as
orientações dos arts. 1.º, IV, e 4.º da Resolução n.° 34 do Conselho das Cidades.
O plano diretor não determinou de forma clara a aplicação dos instrumentos e
não demonstrou, portanto, nos mapas dos anexos, as áreas delimitadas para sua
aplicação.
Ainda sobre os instrumentos,
registre-se que reza ainda o Parágrafo Único do art. 4.º da Resolução n.° 34 do
Conselho das Cidades que, na exposição dos motivos (leia-se, no corpo da
Mensagem n.° 73/2013), o Plano Diretor deveria apresentar a justificativa de
aplicação de cada um dos instrumentos, com vinculação às respectivas
estratégias e objetivos. Aludidas justificativas e vinculação deveriam ter sido
observadas a partir de uma devida concatenação do zoneamento, com os objetivos
pactuados para cada porção do território municipal e com os instrumentos do
Estatuto da Cidade mais adequados e aplicáveis em cada uma dessas porções. Nada
disso, como vimos, ocorreu.
III.4 – Do Zoneamento como um dos
instrumentos do Plano Diretor
O zoneamento é um dos instrumentos
do Plano Diretor a partir do qual é feita a espacialização das soluções
buscadas para a (re)organização territorial de Florianópolis. No processo
participativo realizado no âmbito das oficinas, realizadas entre setembro e
outubro passados, o zoneamento terminou por ser praticamente o único
instrumento de indicação do que as comunidades pleiteavam, mas com muitas
deficiências e falta de esclarecimentos técnicos. Os mapas foram expostos de
forma bi-dimensional, procedimento hoje insuficiente diante de tantas
ferramentas e programas digitais tridimensionais e mesmo com o recurso
tradicional tão utilizados no meio acadêmico e profissional. Portanto, a
pactuação tão perseguida no processo de planejamento compartilhado almejado no
estatuto da Cidade em planejamento urbano participativo não foi alcançada.
Neste sentido, acabou-se reproduzindo os problemas de falta de pactuação como
no processo de elaboração do plano diretor em 2010, quando o PL da PMF foi
rejeitado e novamente e depois de revisado este trabalho feito pelo CEPA, muito
criticado em junho de 2012. A Audiência Pública realizada em outubro passado
repetiu em parte o descontentamento ocorrido nos dois encontros mencionados de
2010 e 2012.
Há falta de vinculação clara entre
o texto do PL e os mapas e tabelas, fato
destacados por análises do CREA, IAB, CAU e OAB e grande parte dos representantes
distritais no Núcleo Gestor, extinto em outubro passado.
III.5 - Sobre parcelamento do solo
na esfera municipal
As normas de parcelamento do solo,
quando não articuladas com o plano diretor, dão margem à possibilidade de se
promover a divisão ou redivisão de porções do território municipal de forma
desconforme e desvinculada com os objetivos da política territorial e
urbanística municipal. O Município, através da regulamentação das normas de
parcelamento do solo, pode e deve exercer sua competência legislativa
suplementar com relação à matéria e estabelecer diretrizes e regras locais para
esta atividade imobiliária. Nesse sentido, com base em aludida competência,
regras locais de parcelamento poderiam ter sido ser inseridas, como, por
exemplo, o tratamento que deve ser dispensado com relação às áreas de uso
público, ou a definição da dimensão mínima de lote a ser observada, como regra
geral, no município. Assim, sente-se falta de uma instituição de normas locais
de parcelamento do solo no âmbito do Plano Diretor, suplementares às normas
gerais de âmbito federal e estadual, o que estabeleceria uma necessária
coerência destas com relação ao plano diretor, e, ainda, facilitaria a consulta
e a aplicação pelos entes públicos e privados. Isto fica claro, quando não se
especifica.
O PLC, ainda, não apresenta
soluções para o grave problema da produção informal de loteamentos e dos
efeitos perversos gerados a partir da nomeação de ruas não incorporadas à
municipalidade. Os dois dispositivos que se aplicariam a esta situação são:
art. 127 das Áreas de Adequação urbana e o art. 237 (Seção VII) que trata da
Regularização Fundiária de Assentamentos Urbanos.
Conforme estudos em artigo do
prof. Paulo Rizzo, do departamento de Arquitetura e Urbanismo da UFSC intitulado
“Plano diretor é Lei e precisa ser um instrumento da legalidade. Uma
perspectiva a partir do processo atual do Plano Diretor Participativo de
Florianópolis” (ver em anexo) desenvolve bem a análise do grande problema da
irregularidade urbanística de Florianópolis, que se estende há décadas e sugere
alguns dispositivos de como se deve regulamentar esta situação social e
urbanística de nossa cidade. Aborda a questão tão propalada no meio legislativo
de situações consolidadas e indica diretrizes e dispositivos de regulamentação
que deveriam ser acatados por esta Casa Legislativa, de forma a evitar-se
continuar a atual situação de irregularidade nos assentamentos construídos e sem um regramento preciso para
tal.
O que o PL especifica em termos de
parcelamento e construção de loteamentos e condomínios são para novos
empreendimentos. Mas, silencia com relação á situação urbanística criada nestes
anos informalidade.
Baseando-se na Lei 11.977/2009, na
Resolução 369/2007, assim como nas experiências concretas sobre regularização
fundiária em diversas cidades brasileiras, com destaque em Recife e Santo
André, nas contribuições do prof. Rizzo e no que se refere ao mecanismo
“Urbanizador Social”, utilizado em Porto Alegre, é possível desenvolver um
regramento mais eficiente para tratar da urbanização informal de Florianópolis.
Não adianta somente restringir o gabarito a dois pavimentos, ainda que seja um
avanço, em regiões ou distritos com alta irregularidade, como Rio Vermelho,
Campeche, Ingleses (região do Capivari), e já começa em Ratones, se continuarem
a reproduzir-se ampliando-se ou persistindo na atual situação social e
urbanística loteamentos clandestinos ou irregulares, que pressionam a CMF para
nomeação de nome de ruas ou logradouros.
Infelizmente, no processo de
elaboração do PL do PD, não se incorporaram as melhores contribuições
acadêmicas dos Cursos de Arquitetura e Urbanismo e Cursos afins ao ambiente
construído, além obviamente de campos de conhecimento tão necessários à cidade,
em um trabalho inter e multidisciplinar. Particularmente, o Curso de
Arquitetura e Urbanismo da UFSC, do qual, a maior parte da equipe de
estagiários e ex-alunos do PD da PMF é constituída, não trouxe para análise e
contribuição os trabalhos desenvolvidos nas disciplinas, por exemplo, de
Urbanismo, que tem acumulado um saber em regiões como Rio vermelho, Campeche e
Santo Antonio. Curiosamente, o prof. Dalmo Vieira, Secretário da SMDU, e
coordenador do Plano Diretor pela PMF, e justamente docente do CAU-UFSC,
apoiou-se, em suas exposições, em premissas do PL inspirado, em parte, em
trabalhos discentes deste curso,. No entanto, não soube referenciar-se no que
este Curso tem desenvolvido de melhor ao longo dos anos.
III.6 – sobre a autoaplicabilidade
dos instrumentos
Quando viável, jurídica e
operacionalmente, o Plano Diretor deve assegurar a autoaplicabilidade dos
instrumentos regulamentados. Por outro lado, Quando comprovadamente inviável
para este momento de readequação normativa, o plano deve estabelecer prazos
para edição de normas municipais específicas que assegurem a plena
aplicabilidade dos instrumentos. Não é o que se verifica, o que se pode
verificar com base em alguns dos dispositivos, constantes no PLC ora sob
consideração, quais sejam:
Art. 111, Parágrafo único. O órgão municipal
de planejamento urbano em parceria com a Procuradoria Geral do Município deverá
desenvolver o mapa das Áreas Verdes de Lazer existentes no prazo de um ano a
partir da publicação desta Lei, Complementar, atualizado a cada ano ou conforme
novas áreas sejam incorporadas na forma da legislação específica.
Art. 121. O Município terá prazo de dois anos
a partir da entrada em vigor da presente Lei Complementar para a elaboração da
carta geotécnica de aptidão à urbanização, estabelecendo diretrizes
urbanísticas voltadas para a segurança dos novos parcelamentos do solo, com o
mapeamento e classificação das áreas de risco geológico, o levantamento de
possibilidades para aproveitamento de agregados para a construção, sem prejuízo
dos estudos já existentes.
Art. 124. O Município terá prazo de dois anos
a partir da entrada em vigor da presente Lei Complementar para a elaboração do
mapeamento, classificação da geodiversidade e das áreas de patrimônio
geológico.
Art. 126, §2º As extensão e abrangência das
áreas de conflito ambiental e urbano deverão ser delimitadas em mapas no prazo
de até 365 dias a contar da data da publicação desta Lei Complementar.
Art. 127, §2º As extensão e abrangência das
Áreas Adequação Urbana deverão ser delimitadas em mapas no prazo de até 365
dias a contar da data da publicação desta Lei Complementar.
Art,. 128, §1º As APC-1 estão indicadas no
mapa de zoneamento parte integrante da presente Lei Complementar e serão
detalhadas em mapas específicos pelo SEPHAN após sua aprovação.
Art. 128, §3º As APC-3 estão indicadas no mapa
de zoneamento, parte integrante da presente Lei Complementar e serão detalhadas
em mapas específicos pelo SEPHAN após sua aprovação.
Art. 325. No prazo máximo de dois anos da
vigência desta Lei Complementar deverão ser iniciados os seguintes planos:
I - plano Municipal de Mobilidade Urbana e
Transporte Integrado; II - plano Municipal de Saneamento Básico;
III - plano Municipal de Habitação de
Interesse Social;
IV - plano Municipal de Macrodrenagem Urbana;
V - plano Municipal de Redução de Riscos; e
VI - plano Municipal de Regularização
Fundiária de Interesse Social e Específico.
Art. 326. O Município de Florianópolis terá
prazo de um ano para correção de sua cartografia básica, com a execução de reambulação
da cartografia atual, verificando as cotas das curvas de nível e a definição da
natureza jurídica dos elementos hídricos, para explicitação em mapa das Áreas
de Preservação Permanente (APP).
Ao priorizar a entrega do plano
diretor na Câmara e não o adequado tempo para promover ajustes finais,
inclusive possibilitando a participação população e de associações
representativas dos vários segmentos da comunidade, a Prefeitura acabou por
encaminhar a esta Casa um PLC que não é autoaplicável no que tange ao objeto
regulado nos dispositivos logo acima citados. Em outras palavras, enquanto os
prazos acima não forem observados, se é que o serão, o município poderá ter que
esperar:
ü
até um ano para promover soluções para as Áreas Verdes de Lazer;
ü
até dois anos para aprovar com segurança novos parcelamentos do
solo (o que nesse caso, ainda estaria em desacordo com a diretriz do art. 2.º,
VI-h, do Estatuto da Cidade);
ü
até dois anos
para melhorar e restaurar a sua geodiversidade;
ü
um ano para
trabalhar sobre as chamadas Àreas de Conflito Ambiental e Urbano e Áreas de
Adequação Urbana;
ü
não se sabe
quanto tempo para conferir efetividade às regras para as Áreas de Preservação Cultural;
ü
não se sabe quanto tempo para ter os planos setoriais previstos
no art. 325, ressaltando aqui o que foi bem observado pela OAB/SC, qual seja,
que o plano Municipal de Mobilidade Urbana e Transporte Integrado deve ser
aprovado até abril de 2015;
ü
um ano sem
cartografia básica para o planejamento e a gestão das Áreas de Preservação Permanente.
III.7 - Sobre análise da emendas
ao PLC 1292/2013 - Emendas ao Plano
Diretor afetam áreas de preservação e de lazer e aumentam andares de prédios
Apresentamos, a seguir, e para que
se tenha ideia da magnitude e impactos que as emendas em trâmite nesta Casa
Legislativa podem provocam, fizemos uma Análise Geral das emendas apresentadas
ao projeto do Plano Diretor e entregues no Gabinete no dia 12 de novembro de
2013. As emendas assinaladas abaixo têm teor que ameaça reivindicações das
comunidades e aumenta ocupação em áreas com problemas de infra-estrutura:
1- Emenda transforma a Ponta do
Coral de Área Turística e de Lazer (ATL, proposta da prefeitura) em Área Mista
Central (AMC) com gabarito de 16 andares. Isso é inviável pelo impacto que
provoca na infra-estrutura, na capacidade de suporte da região e na paisagem.
2- Emenda transforma a Ponta do
Goulart, que integra a proposta do Parque das Três Pontas, de Área de
Preservação Permanente (APP) para Área Residencial Predominante (ARP),
permitindo construções residenciais de até 2 pavimentos. Outra emenda para o
Ponta do Goulart reduz a APP, transformando parte dela em Área de Preservação
Limitada (APL), o que viabiliza edificações com ocupação em até 10%.
3- Emenda transforma Área de
Estudo Ambiental (AEA) em Área de Urbanização Especial (AUE), permitindo
urbanização em região do Pântano do Sul que é alvo de forte luta da comunidade
local para evitar ocupação em área alagada.
4- A área pertencente ao Exército
na rua Bocaiúva não recebeu tratamento diferenciado no projeto do Plano
Diretor. Em emenda, a área é proposta como Área Comunitária Institucional
(ACI), o que viabiliza a construção de equipamentos que podem ameaçar a fauna e
flora local. Essa área deveria ser uma Área Verde de Lazer (AVL), ampliando o
baixo número de AVLs no município.
5- Emenda propõe que se duplique,
em relação ao projeto da prefeitura, o número de andares na margem direita da
SC-401, sentido Centro-Bairro, de 3 para 6 andares. Não há previsão de áreas
verdes nem de infra-estrutura para dar conta desse aumento.
6- Emenda transforma uma Zona
Especial de Interesse Social (ZEIS) próximo à CEF, na Agronômica, em Área Mista
Central (AMC) com prédios até oito pavimentos. A ZEIS foi prevista pela
prefeitura e permite moradias para população de baixa renda, que já vive há
anos no local.
7- Emenda transforma Área de
Preservação com Uso Limitado (APL) em Área Residencial Predominante (ARP) com 2
pavimentos no Morro do Jurerê, em Canasvieiras. Isso permitirá ocupação maior
do que os 10% permitidos em APL.
8- Emenda transforma Área
Comunitária Institucional (ACI) da Marinha, no Estreito, em Área Mista Central
(AMC) com 12 pavimentos. Ali deveria ser Área Verde de Lazer (AVL), já que a
população da parte continental da Capital tem o menor índice de AVL por
habitante, de 0,5 metros quadrados de área de lazer por habitante.
9- Emenda transforma Área Mista
Central (AMC) de 4 pavimentos na área entre a túnel no Saco dos Limões e o
supermercado Baía Sul, aterro da Baía Sul e rua geral do Saco dos Limões para
AMC de 8 pavimentos. Isso fere o princípio de se proteger a paisagem, previsto
no projeto da prefeitura.
10- Emenda transforma parte da
Área Verde de Lazer (AVL) e Área Turística Residencial de 2 pavimentos para
Área Mista Central (AMC) de 6 pavimentos em Coqueiros (área do Ataliba) e
retoma projeto de prolongamento da via Wilson Luz, com largura de 22 metros e
meio, cortando parte do Parque de Coqueiros. Também transforma em Área
Residencial Mista (ARM) de 6 pavimentos uma Área de Preservação com Uso
Limitado (APL) no início da Praia do Meio.
11- Emenda transforma Área
Residencial Mista (ARM) de 2 pavimentos para Área Turística Residencial (ATR)
de 6 pavimentos na área do Veleiros (Prainha e José Mendes), afetando a
paisagem e a visualidade para o mar.
12- Há várias emendas que aumentam
o número de andares de prédios em Coqueiros, Capoeiras, Centro, Estreito e
Trindade. Exemplo 1: em Coqueiros, emenda aumenta de 6 para 10 os pavimentos em
Área Mista Central (AMC) e de 6 para 8 os pavimentos em Área Residencial Mista
(ARM). Exemplo 2: no Centro, emenda permite que área passe de 4 para 12
pavimentos, ampliando ainda mais verticalização do Centro.
13- Há várias emendas que
transformam Áreas de Preservação com Uso Limitado (APL) em áreas com
possibilidade de maior ocupação residencial e urbana, como na Lagoa da
Conceição, Campeche, Santinho, Vargem do Bom Jesus, Canasvieiras/Jurerê,
Ingleses e Cachoeira do Bom Jesus.
14- Emenda garante “direito de
construção” ao proprietário de terreno que obteve alvará de construção antes da
nova lei do Plano Diretor, mas teve o zoneamento de sua área modificado por
ela. O projeto de lei da prefeitura garante apenas que o proprietário possa
conservar e reformar as edificações existentes, mas não dá a ele o direito de
construir
III – Do voto
III - Do voto
Face ao exposto, e
CONSIDERANDO que os conteúdos estabelecidos pelo Estatuto da Cidade e
pelas Resoluções do Conselho Nacional das Cidades (CONCIDADES) não foram
adequadamente observados;
CONSIDERANDO que a aplicação da
Lei nº 10.257, de 2001 (Estatuto da Cidade) não respeitou os pressupostos de
gestão democrática e participativa;
CONSIDERANDO que se espera que o
Poder Legislativo, instituição legítima e autônoma para avaliar e deliberar
sobre o presente Projeto de Lei, resgate o processo participativo, direito de
cada cidadão e cidadã, e proponha seu aperfeiçoamento;
CONSIDERANDO que a proposição como
está não pode ser aprovada, posto que precisa ser aperfeiçoada;
CONSIDERANDO, a necessidade de que
seja dada a oportunidade aos responsáveis técnicos do âmbito do Poder Executivo
municipal, para que se pronunciem acerca dos óbices aqui apontados;
CONSIDERANDO, finalmente, a
importância de que sejam respondidos todos os questionamentos feitos no corpo
do presente voto de vista;
CONSIDERANDO as recomendações da
OAB/SC, constantes nas fls. 237 a 243 dos autos deste PLC;
CONSIDERANDO as manifestações e
solicitações do IAB/SC, constante nas fls. 244b e 245;
CONSIDERANDO o protesto da Bancada
Popular do Núcleo Gestor Municipal do Plano Diretor, constante nas fls. 247 e
248;
CONSIDERANDO, com todo o respeito
ao nobre relator, a vagueza e a fundamentação praticamente inexistente do
parecer apresentado,
Profiro meu voto em separado,
divergindo do voto do relator, e solicitando o envio dos autos ao IPUF, para
que aludido órgão se manifeste sobre todos os óbices apontados e responda a
todos os questionamentos feitos ao longo desse voto em separado.
Após, retorne-se a esta Comissão
para conclusão de parecer.
É o Voto.
Sala das Comissões, 18 de novembro de 2013.
PROF. LINO FERNANDO BRAGANÇA PERES
Vereador
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